Conforme relatado por Cabral et al. (2020), o microbioma ruminal, caracterizado pela comunidade de bactérias, protozoários e fungos, exerce elevado efeito sobre a nutrição, saúde e desempenho dos bovinos.
Assim, grandes avanços na ciência e tecnologia aplicadas à nutrição e produção de bovinos são dependentes da melhor compreensão desse complexo ecossistema microbiano (Russell et al., 1992).
Nesse sentido, tem sido possível manipular o microbioma ruminal e sua ação fermentativa com o foco na redução da emissão de metano, controlar a excessiva produção de amônia, incrementar a digestão da fibra, assim como prevenir e controlar distúrbios digestivos e metabólicos que costumam acometer animais em confinamento.
Entretanto, Cabral et al. (2020) evidenciaram as limitações do uso das técnicas atuais, como aditivos e ajustes dietéticos, com o objetivo de manipular o microbioma ruminal e seus efeitos na ação fermentativa em animais adultos.
Fato inerente à alta capacidade da microbiota ruminal de se adaptar e se recuperar de transtornos ou “perturbações”, em decorrência da sua elevada resiliência (Weimer, 2015).
Dessa forma, a população microbiana ruminal tende a se adaptar ao uso de aditivos com o tempo de exposição, retornando ao “status” inicial após a retirada do agente modificador adicionado à dieta (Weimer et al., 2010).
Nesse sentido, Yanez-Ruiz et al. (2015) destacaram que a fase de estabelecimento da microbiota ruminal pode representar uma “janela” para que a mudança no microbioma ruminal seja feita de forma mais efetiva e duradoura.
Entenda “janela”, como oportunidade, ou seja, momento ou período em que a estratégia deverá ser usada para surtir efeito. Segundo os autores supracitados, seria mais difícil modificar o microbioma ruminal plenamente estabelecido em animais adultos “fora dessa janela”, devido a provável forte especificidade que se estabelece entre a microbiota e o animal hospedeiro (Kittelmann et al., 2014).
Com o objetivo de recordar que o ruminante nasce com o rúmen e seu trato digestivo totalmente estéril, é no ambiente extrauterino que o animal inicia o processo de colonização do seu trato gastrointestinal (TGI). |
Adicionalmente, o neonato também “adquire” microrganismos do rúmen pelo contato com superfícies que abrigam microrganismos, tais como a teta da vaca no momento da mamada, o comedouro e bebedouro, cerca, paredes, forragem, solo ou fezes (Hungate, 1996).
Considerando que o estabelecimento da microbiota ruminal é um processo dinâmico e gradativo, cabe salientar que a população microbiana ruminal observada nas primeiras 24-48 horas de vida do animal é relativamente distinta daquela observada a partir das 8-12 semanas de vida (Jami et al., 2013).
Dessa forma, microrganismos aeróbios e anaeróbios facultativos (colonizadores iniciais) vão sendo gradativamente substituídos por uma população microbiana anaeróbia estrita (altamente sensíveis ao oxigênio), que é estimulada pela presença de alimentos sólidos (Jami et al., 2013). |
Contudo, é próximo ao desmame ou após sua ocorrência, que se observa, na maioria dos animais, o estabelecimento da microbiota ruminal semelhante à verificada nos animais adultos, sendo esse momento considerado a chamada “janela” para que as alterações permanentes na comunidade microbioana ruminal sejam realizadas (Yanez- Ruiz et al. 2015; Jami et al., 2013).
Na Tabela 1 são listados alguns trabalhos realizados com animais ruminantes (bovinos e caprinos) em que os animais na fase de aleitamento e desmame foram submetidos a intervenções, seja por aditivos ou da dieta, para avaliar o efeito sobre o microbioma ruminal.
Nos estudos de Abecia et al. (2013 e 2014), por exemplo, foi avaliado o uso de um composto inibidor (BCM = bromoclorometano) de bactérias metanogênicas (Archaea), fornecido para as cabras e/ou para seus cabritos. Foi verificado que o BCM fornecido precocemente aos cabritos alterou a composição da população metanogênica e, consequente mente, reduziu a produção de metano dos animais tratados.
Este efeito se manteve mesmo após três meses de suspensão do tratamento e houve também influência do BCM quando fornecido para cabras adultas na alteração da população metanogênica no rúmen dos seus filhotes.
Em outro estudo, Abecia et al. (2014b), avaliaram a presença ou ausência das cabras (mães), sobre a comunidade microbiana ruminal e características fermentativas de seus cabritos (Filhos).
Foi verificado que a presença das mães causou alteração do microbioma ruminal dos filhotes, mas principalmente que, houve alteração da comunidade microbiana dos filhotes ao considerar a dieta pré-desmame, ou seja, efeito do sucedâneo do leite x leite materno no microbioma dos filhotes.
Em um estudo com bezerros leiteiros, Dias et al. (2017) avaliaram o efeito de dietas exclusivamente compostas por leite ou leite mais concentrado sobre a comunidade microbiana ruminal do nascimento aos 63 dias de idade. Foi observado que o uso de concentrado promove aumento na abundância de bactérias fermentadoras de carboidratos não fibrosos, permitindo com isso o estabelecimento de organismos metanogênicos.
Outro ponto estudado recentemente é o possível efeito do microbioma ruminal sobre a eficiência alimentar (EA = ganho/ consumo) dos animais (Wallace et al., 2015).
Este índice tem impacto significativo no custo de produção e pode determinar o lucro do produtor, uma vez que a dieta representa o principal componente do custo de produção dos animais.
Dessa forma, animais mais eficientes apresentam mesmo desempenho com menor consumo ou maior desempenho com mesmo consumo que animais menos eficientes.
Até pouco tempo atrás, as possíveis explicações para a maior eficiência de alguns animais em relação aos seus contemporâneos era relacionada ao menor custo de mantença (menor tamanho ou peso de órgãos metabolicamente ativos) ou maior eficiência de uso da energia (menor turnover proteico e menor desacoplamento mitocondrial) (Davis et al., 2016).
Entretanto, alguns grupos de pesquisa vêm indicando que animais mais eficientes podem apresentar diferentes comunidades microbianas no rúmen, o que poderia implicar em processos digestivos e fermentativos mais eficientes para o animal (Wallace et al., 2015).
Tal raciocínio tem embasamento teórico, considerando que o rúmen é o principal compartimento digestivo no TGI dos ruminantes, colaborando com cerca de 70% da digestão dos polímeros dietéticos e, a partir disso, forneça cerca de 70-80% da energia usada pelo animal para mantença e produção e mais de 60% da proteína metabolizável (Van Soest, 1994)
Tabela 1. Compilação dos principais estudos realizados com ruminantes jovens em que foram avaliadas estratégias para alteração do microbioma ruminal na fase inicial da vida (pré-desmame e desmame)
Na Tabela 2, são listados alguns trabalhos em que foi relacionado o microbioma ruminal com variáveis nutricionais ou produtivas em bovinos de leite e corte.
Jami et al. (2014) observaram forte correlação entre a proporção de Firmicutes/ Bacterioidetes no rúmen de vacas de leite e a produção de leite corrigido para gordura.
Estes autores concluíram que há evidências de que a comunidade bacteriana ruminal exerce papel em modular parâmetros fisiológicos e produtivos dos animais.
Wallace et al. (2015) verificaram que a abundância de genes do domínio Archaea no rúmen tinha alta correlação com a emissão de metano em bovinos de corte, tendo observado ainda que animais que eram baixos emissores de metano apresentavam elevada abundância de bactérias da família Succinovibrionaceae e mudanças na produção de acetato e H2.
Em outro estudo, Shabat et al. (2016) verificaram que no rúmen de vacas eficientes havia menor abundância (diversidade) de espécies microbianas e menor expressão de genes pela microbiota ruminal.
Os autores destacam como resultados principais do estudo, o aumento expressivo da abundância das bactérias Megasphaera elsdenii, Coprococcus catus e Prevotella albensis, bem como aumento na expressão de genes associados à via do acrilato, a qual é uma via consumidora de H2. Dessa forma, o aumento na abundância de espécies microbianas e suas vias metabólicas no microbioma ruminal resultariam em menor eficiência de uso da energia no rúmen e, consequentemente, pelo animal.
Roehe et al. (2016) verificaram que grupos de progênies de diferentes touros (de raças diferentes) apresentavam diferentes emissões de metano, sendo separados em animais de elevada emissão e de baixa emissão de metano.
Tabela 2. Compilação dos principais estudos realizados com bovinos em que foi avaliado o efeito do microbioma ruminal e a eficiência alimentar dos animais
Os autores verificaram que animais de elevada emissão de metano (animais ineficientes) apresentavam elevada proporção de Archaea/Bacteria ruminal, bem como detectaram por meio de análise metagenômica e metatranscriptômica do microbioma ruminal, que alguns genes (20 a 40 genes) explicavam cerca de 81% da variação da emissão de metano e da eficiência alimentar dos animais.
Dessa forma, os autores citam que há uma herdabilidade do microbioma ruminal que poderia ser usada para selecionar animais mais eficientes, assim como aponta Wallace et al. (2019).
Portanto, os trabalhos citados permitem inferir que seja possível, via seleção de grupos microbianos mais eficientes no rúmen, aumentar a eficiência alimentar dos animais, bem como que parte da melhor eficiência dos animais seja explicada por microrganismos e vias metabólicas mais eficientes no ambiente ruminal.
As informações aqui apresentadas dão suporte à ideia de que alguns fenótipos (produção e eficiência) dos animais podem ser correlacionados e explicados por diferentes grupos microbianos e vias metabólicas mantidas no rúmen, reduzindo a emissão de metano e, consequentemente, aumentando a eficiência produtiva dos animais.
Seguindo esse raciocínio, pode ser inferido que o entendimento do microbioma ruminal associado às alterações da dieta dos animais antes e durante o confinamento podem ser usadas para aumentar a eficiência dos animais e prevenir a ocorrência de distúrbios digestivos, tais como a acidose ruminal, tema do nosso artigo na próxima edição da nutriNews Brasil. |
Luciano Cabral1, Thiago S. Andrade1, Laura B. Carvalho1, Thainá P. S. Cabral2, Bárbara S. M. Neta1
1 Faculdade de Agronomia e Zootecnia, Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Cuiabá, MT
2 Instituto de Biociências, Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Cuiabá, MT
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